Tem espaços na cabeça que não vão embora nunca. Ainda mais quando nós tivemos que imaginar um. Pega um exemplo: uma vez, escrevendo uma novelinha, percebi que tinha escolhido colocar um guri e o vô dele, personagens dessa história, num quarto que eu já tinha imaginado antes, em outro momento, um quarto conhecido. Foi depois de alguns dias que me dei conta: o cômodo era o mesmo em que o personagem central do livro do Raduan Nassar, o Lavoura Arcaica, passa maior parte do tempo. Lá ele também recebe o irmão, que ficou de resgatar e trazer de volta o filho pródigo da família.
Espaços como esse são únicos, mas volta e meia aparecem.
Hoje, lendo À mão esquerda, romance do Fausto Wolff, aqui na casa da praia dos tios da Alice, voltei a acessar um espaço imaginado. A casa da infância de Pérsio, o protagonista do Wolff, é esta. É esta, mas há mais de muitas décadas, imaginada por mim a partir do quadro que está pendurado numa de suas paredes: uma casa simples de madeira, com a cozinha nos fundos e muita grama, muito mato em volta. No canto do terreno, lá atrás, uma caixa sob telhas de barro: uma patente.